sábado, 20 de dezembro de 2008

A Teoria do Copo

A Teoria do Copo é uma hipótese que comecei a esboçar na primavera de 2004. Trata-se de um assunto de conhecimento bastante restrito. Até, de certa forma, acostumei-me a tratar dele de forma mítica, de forma que foi anti-homeopaticamente que o mencionei na última postagem. O título, "Off-topic", foi porque eu não planejava esclarecer sobre o que dizia, até então.

Pois, às gargalhadas, simplesmente não resisti à tentação de comentar, tão logo passei por certo trecho da publicação SARTRE em 90 minutos, de Paul Strathern. O trecho é o seguinte:

Num dia de folga estava sentado bebendo coquetéis de damasco com Castor e Aron num café de Montparnasse. Sartre manifestava sua insatisfação com a filosofia — ela nunca dava conta da vida real. Aron discordava: não ouvira falar do filósofo alemão Husserl e da fenomenologia? “Veja, meu camaradinha, se você é fenomenólogo, pode falar dessa bebida e isso é filosofia.”

Mais adiante, encontrei uma excelente e instigante descrição de uma experiência semelhante a uma que eu tivera, da qual retirei algumas vagas impressões, as quais me habituei a denominar reverenciosamente de "Teoria do Copo". Obviamente, a versão do talentosíssimo Jean-Paul Sartre. O trecho abaixo, extraído da mesma obra que o anterior, faz referências ao romance A náusea, de Sartre, protagonizado por Roquentin:

Essa busca fenomenológica atinge o clímax numa passagem famosa em que Roquentin examina e “experimenta” uma raiz de castanheiro. (...) para Roquentin a particularidade do castanheiro se torna totalmente estranha e, no entanto, absorvente. “Ele não tinha mais o caráter inofensivo de uma categoria abstrata; era o visgo da realidade, essa raiz moldava-se na existência... a diversidade das coisas, sua individualidade, era apenas uma ilusão, um verniz. Esse verniz se derretera, dando lugar a uma úmida solidez, monstruosa e caótica — nua, obscena e terrivelmente nua.” (...)

Durante essa experiência, Roquentin tinha sido “nada além de consciência”. E concomitantemente a essa consciência veio a percepção do absurdo total de tudo. Porém, mais uma vez, não era uma percepção intelectual. “Esse absurdo não era nem uma idéia mental nem uma palavra proferida, mas essa longa serpente apodrecendo aos meus pés, essa serpente de madeira [i.e., a raiz de castanheiro]. Percebi que tinha descoberto a chave da existência, a chave da minha náusea, de toda a minha vida... Experimentei o absoluto: o absoluto ou o absurdo... Examinando essa grande pata bulbosa [a raiz], nem a ignorância nem o conhecimento importavam: o mundo de explicações e razões não é o da existência.” Como resultado, Sartre compreendeu: “o homem é o que ele é no tempo presente, e apenas aí ele é.” Isso teve importantes implicações para aqueles que buscavam o sentido da própria existência: “não podemos colocar a vida em perspectiva enquanto a vivemos — ela se aproxima furtivamente por trás e de repente você se vê dentro dela.”

Desde aquela minha primavera riquíssima de experiências, a Teoria do Copo tornou-se-me um ícone singular de um estado de consciência considerado ideal — indiferentemente ao absurdo. Imediatamente após a breve experiência — certamente menos profunda que a do personagem auto-biográfico de Sartre —, percebi minhas faculdades mentais se ampliarem sensivelmente, o que me foi o mais instigante. Diversas vezes minhas pesquisas filosóficas me remeteram a trabalhá-la, às vezes com resultados subjetivos fantásticos, e, na maioria, decepcionantemente passageiros. Mas sempre houve um embrião crescente, um grande auxiliar diante de minha generalizada inquietação. Vê-se, dessa forma, que minha identificação com o existencialismo não é tão recente como talvez tenha parecido.

Em tempo: o que Roquentin passou com uma raiz de castanheiro, passei com um copo americano vazio e limpo sobre uma mesa.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Off-topic

A Teoria do Copo é um estudo fenomenológico.

Marco

Existencialismo.

Aprendizado

Complementando o que aprendi num precário diálogo com Mr. Black, surge-me a distinção entre a verdade objetiva e a subjetiva. Parece que passei algumas linhas aqui tentando discutir quais delas era a melhor, ignorante da absurdez...

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Tricotomia

Tudo coisa besta, coisa muito besta. Wittgenstein, que era foda, não viu grande utilidade em seu Tractatus Logico-Philosophicus. Ele manda em mim, apesar de eu não ter visto mandamento nenhum. — Pois ele me confirma: é mesmo tudo coisa muito besta.

(...)

Já não me satisfaz a ilustração linear (ou progressiva) de minhas mudanças. Comigo ocorre como com a História: algumas coisas vão, outras ficam, outras voltam, um pouco diferentes. O que pode ser progressivo é o mais profundo, o que as descrições não alcançam. Tudo que é descritível o é por ser suficientemente superficial. Por não ser possível conhecer as profundezas, é preciso encontrar satisfação em conhecer apenas mais profundamente. E, prosseguindo com a questão do modelo de estrutura do indivíduo, temos que talvez a essência seja imutável — ou, em outras palavras, ela não satisfaz o propósito. Destarte, a essência é irrelevante. Portanto, chega de metafísica.

(...)

Um grande amigo esteve me contando sobre sua concepção tricotômica do indivíduo, com a clássica divisão de corpo, mente e espírito. Eu já havia tratado dessa questão num texto que, como vi depois, não coloquei neste blogue. É fato que eu já havia notado que esses três elementos são de certa forma interdependentes, mas vejo que essa concepção não me tinha grande valor prático, tal qual a de meu amigo se me apresentou. A idéia central, numa transposição para meus conceitos, seria que os três elementos — corpo, mente e espírito — possuem vontades independentes, ao passo em que se afetam mutuamente. No caso de que as três vontades convirjam, resultar-se-ia numa ação harmônica poderosíssima; na ausência dessa convergência, maior ou menor grau de conflito, com prejuízo da ação resultante e, especialmente, do indivíduo.

Ponto possivelmente controverso seria quanto às conseqüências práticas dessa concepção. Afinal, como se daria a harmonia entre as três forças? — Ou, ainda, mais a propósito de minha pesquisa, como seria possível atuar sobre essas forças? — Infelizmente não chegamos a discutir esse ponto sumamente importante, embora seja evidente que, nessa concepção, as ações do indivíduo devam-se orientar pelo consenso, seja este natural ou provocado. Estou acostumado a me conceber como sendo eu apenas minha mente, que obedece às ordens dos demais. E tenho suposto que meu objetivo maior seja a libertação desse eu — um eu, numa nova concepção, fracionado —, o que constitui uma explicação coerente para os violentos conflitos interiores pelos quais tenho passado. 

Embora eu pretenda defender minha autonomia como ser racional, a teoria me pareceu suficientemente consistente, a ponto de me influenciar. Na perspectiva mais conservadora, fica alerta a vigilância. Pretendo considerar a hipótese de que não me convenha impor rispidamente a vontade de parte de mim sobre o resto de mim mesmo. Alegra-me a possibilidade de resumir a maior parte do meu sofrimento num simples equívoco conceitual.

Assim falou Moko-Sotustra

"A sensibilidade é uma evolução da lucidez."

Painter Jane


Quanto mais vou esperar
Pra você dar as caras por aí?
Parece uma criança, só sai com as amiguinhas

Deixa de ser difícil assim
Por que você não sai do seu quartinho e vem pra mim?

Mas se um indie te chamar 
Para um jazz no Rayuella, você vai
Deixa a faca no meu peito e vai
Me deixa à espera de um beijo e vai
Sair com outro cara que não quer
Nada além
Apenas uma noite e nada mais

Cedo ou tarde vou lembrar
De você no seu carango por aí
Ao som de Belle & Sebastian
And you're my Painter Jane, my dear
Por que é que você não me dá o seu telefone?
Que eu te busco, e a gente se perde por aí

Mas se eu for te chamar
Prum drive-in ou para um bar você vai?
Não!
Diz que tá doente e não vai
Já fica no ausente e não vai
Desdém é o que você dá pra quem te quer
E como quer
E joga o meu amor ao Deus dará

Mas se um indie te chamar
De terninho e All-star, você vai
Deixa a faca no meu peito e vai
Me deixa à espera de um beijo e vai
Sair com outro cara que não quer
Nada além
Apenas uma noite e nada mais

Especulação Zen

É melhor viver num mundo grande ou num mundo pequeno? — Suponhamos que haja dois mundos, tal qual bem focalizam as espiritualidades orientais. Concebamos o "mundo interior" e o "mundo exterior". Talvez... — Opa! Acabei de receber a letra de Painter Jane! Esquece o resto...

Música de trabalho

(Renato Russo)

Sem trabalho eu não sou nada
Não tenho dignidade
Não sinto o meu valor
Não tenho identidade

Mas o que eu tenho é só um emprego
E um salário miserável
Eu tenho o meu ofício
Que me cansa de verdade

Tem gente que não tem nada
E outros que tem mais do que precisam
Tem gente que não quer saber de trabalhar...

Mas quando chega o fim do dia
Eu só penso em descansar
E voltar pra casa, pros teus braços
Quem sabe esquecer um pouco
De todo o meu cansaço
Nossa vida não é boa
E nem podemos reclamar

Sei que existe injustiça
Eu sei o que acontece
Tenho medo da polícia
Eu sei o que acontece

Se você não segue as ordens
Se você não obedece
E não suporta o sofrimento
Está destinado a miséria

Mas isso eu não aceito
Eu sei o que acontece
Mas isso eu não aceito
Eu sei o que acontece

E quando chega o fim do dia
Eu só penso em descansar
E voltar pra casa, pros teus braços
Quem sabe esquecer um pouco
Do pouco que não temos
Quem sabe esquecer um pouco
De tudo que não sabemos

sábado, 13 de dezembro de 2008

Painter Jane

Não encontrei a letra na internet, mas é uma coisa que estou resolvendo. Estou num momento Painter Jane. Maiores informações aqui.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Mais especulação

É necessário ter objetivos? — Essa questão parece se assemelhar com a questão dos propósitos; mas, diferentemente, "objetivo" — termo originado de "objeto" — pressupõe a existência de um sujeito cognoscente. Entendamos "objetivo" como "aquilo que é desejado (pelo sujeito)". Logo, considerando que "desejo" é um substantivo originado de derivação imprópria do verbo desejar (eu desejo), verbo o qual, por sua vez, é intrinsecamente transitivo; considerando que o desejo é imprescindível para a manutenção da vida; e considerando que a vida é imprescindível para os propósitos da necessidade e do objeto, temos que é necessário ter objetivos.

Convém selecionar os objetivos? — Primariamente, "conveniente" significa "útil, proveitoso, interessante". Já o termo "selecionar" possui íntima ligação com o termo "preferir", que se guia pelo próprio conceito de conveniência, seu objetivo particular. Logo, convém selecionar (o que quer que seja).

Existem coisas impossíveis? — Impossível é o que contradiz; o que é falso. Empiricamente, é o que contradiz alguma lei verificada. Praticamente, é o que escapa dos domínios do poder. Nesses termos, existem coisas impossíveis.

É sempre possível selecionar? — Seleção pressupõe multiplicidade; logo, só é possível selecionar entre mais de uma concepção. No entanto, é prerrogativa irrevogável do sujeito cognoscente a multiplicação de suas próprias concepções. Logo, o sujeito possui o poder necessário, de forma que é sempre possível selecionar.

É possível selecionar os desejos? — Considerando que é sempre possível selecionar, é sempre possível selecionar os desejos.

É sempre possível manipular os desejos? — Considerando o que vemos ocorrer com o desejo sexual, a fome e a sede; com o risco da extrapolação, a experiência sugere que sim. Outrossim, considere-se que a multiplicação das concepções também o afirma.

Por que manipular os desejos? — Para que, diante dos obstáculos encontrados para sua satisfação, o desejo não morra. Porque sem desejo morre o sujeito.

Investigação

É imprescindível estar satisfeito? — Ainda não tenho opinião sobre isso. Mais conveniente é a resposta negativa; mais fácil, afinal. Mas vejamos...

Não pode haver satisfação em tempo integral. Algumas coisas só existem em pares com seus opostos — eis o fundo lógico do maniqueísmo. Supondo que a satisfação fosse algo permanente, seria forçoso admitir que o conceito perderia seu propósito. Isso é básico. Dessarte, temos dilematicamente uma meia-resposta: é impossível estar satisfeito o tempo todo.

Mas por que que desejo estar satisfeito o tempo todo? — Ora, mais fundamental que o problema da satisfação é o problema do desejo. Desejo é a força que impulsiona o espírito à ação — observe-se o desejo sexual, a fome e a sede; observe-se o desejo pelos bens materiais, pela vitória e pela felicidade. Na ausência do desejo temos um espírito passivo, inerte, sombrio, desprovido de tudo aquilo que qualifica a vida. Se pudermos admitir que o desejo é peça fundamental da vida, parece razoável supor que a carência do desejo cause a morte. Vivo, logo desejo; desejo, logo vivo. Mas voltemos à questão...

Considerando que o desejo é um componente necessário e desejável da vida; que a morte é inevitável; que é impossível estar satisfeito o tempo todo; e que o Paraíso é o lugar onde as três afirmações anteriores são falsas, desejo estar satisfeito porque sou ao mesmo tempo descrente e desejoso da vida eterna. Sou uma quimera.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Prece de um cristão agnóstico

Aprendizado é algo mau? — Longe de mim! Que filósofo seria eu se cresse nisso assim, brutamente? — Pois, há perniciosidade potencial em tal crença: — Suponhamos que as verdades sejam absolutas, e que às conclusões violentamente verossímeis coubesse a classificação de verdadeiras. — Então caberia um esforço colossal para a manutenção do heróico feito, ainda que a verossimilhança de então já não se impusesse como tal em decorrência do desfalecimento da outrora berrante impressão. — Pois, suponhamos assim: que a evidência imediata seja um critério suficiente-bastante para a glorificação futura, e que o que vier o pressuponha. Suponhamos, pois, assim, e assim prossigamos.

Assim se obriga a manter e justificar as possivelmente meras opiniões anteriores. Assim atribui-se à emoção — e não à evidência — o poder supremo de persuasão. Assim, com o sentimento de reverência ao fato emocionalmente relevante e em gozo do direito de abstenção, aceita-se forçosamente como definitiva uma conclusão possível-meramente momentânea. Assim a falácia deificadora obtém seu adjetivo. Assim nasce um dogma, o que possível-infelizmente afasta o filósofo do cristianismo, ao qual seria mais fácil servir estando-se isento da influência destarte nefasta da dita Santa Igreja Católica, além doutras ditas autoridades cristãs menos relevantes (para mim).

Sinto que ainda desenvolverei muito-mais-profundamente minha fé; mas, queira Deus — se é que existe —, eu não me renda à religiosidade comum das verdades indiscutíveis. Seja Deus recorrentemente evidente. Deus, se existe, entenderá minha prece; se existe e não a entende, — e com todo o respeito que lhe caiba — que ele se foda assim como eu. Amém.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Propósito

Será preciso ter princípios? Pois, tê-los talvez seja simplesmente útil. "Preciso"... Será, pois, que a Moral está assim tão pressuposta em meus conceitos a ponto de que eu simplesmente me deixe levar por ela? Afinal, persiste em minhas reflexões a idéia de precisão, necessidade; menos como imperativo de sobrevivência que como dever, obrigação; como uma conseqüência fatal de algum pressuposto indizível. Ter princípios para quê?

Eu me lembro com certa clareza de quando me tomou forma o problema dos princípios. Estava num bar a que costumava freqüentar, assistindo à apresentação de um músico que bem pode não ser o que me vêm à mente neste momento. Em decorrência de algum gesto seu — o qual, em si, não me foi relevante —, me sobreveio a certeza de que a gente — "o povo", "a sociedade", "eles" — deseja a quem tem princípios. Sabe-se lá se não teria sido eu quem os desejava ter. Mas, enfim, passou-me a impressão de que, tendo princípios — ainda que fossem princípios incertos, discutíveis, idióticos;  mas se eu os tivesse —, teria a chance de ser amado, como eu não era, como não sou. Minha busca por princípios teve origem utilitarista; talvez um flerte, um desvio de caráter por ocasião de algum sofrimento demasiado.

Disciplina é uma virtude que não tenho tido. E talvez seja o que mais me falte para que eu consiga suportar a vida de dúvida, o meu caminho evidente. Minha dúvida é fatalística; ao passo que, ao contrário do que tenha proposto Humberto Gessinger, ter certeza não me parece em nada ser inútil. Acontece que a pureza infantil — ou, talvez melhor,  o gozo infantil —, o que enfim almejo, sofre as objeções naturais do mundo civilizador, do qual ainda dependo, e justamente para obter o objeto do meu desejo.

Então talvez a solidão seja o meu melhor caminho. Talvez a fé em mim mesmo — apenas em mim mesmo. Mas não me parece ser possível ter fé na dúvida. Quem tenha dito ter aceitado sua dúvida converteu-a num dogma, num princípio, numa certeza. E talvez também se declare feliz. Pois, ao que parece, meu caminho não me levará à felicidade. Meu caminho não é o que desejo, nem me trará a paz. Fatalmente e apenas, meu caminho é o que sou. Meu caminho, afinal, é o meu propósito. Amém.

Cristianismo

O amor suscita ao que a moral obriga.

Metafísica

Propósito é pressuposto da existência.

domingo, 23 de novembro de 2008

Decreto nº 5

Art. 1º Fica vedada a publicação de novos decretos,  hipóteses e princípios neste blog.

Art. 2º Fica suspensa a publicação de novos textos neste blog, independentemente da natureza, até que o Autor reconheça propósito para tal.

§1º Caso o Autor não reconheça o propósito até 1º de dezembro de 2008, o acesso a este blog poderá ser suspenso.

Art. 3º Este decreto entra em vigor em 24  de novembro de 2008.

Hipótese

A arte é o amor na prática.

Hipótese

Este blog já não tem propósito. Talvez tenha tido.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Hipótese

Aprendi a descrer do amor. Do amor, minha mais profunda decepção! Ah!, como estive apaixonado!... Tão sinceramente apaixonado!... Tão belamente apaixonado!... E nos abandonamos reciprocamente, minha maior fonte de vida e eu!... Ainda mais dolorosa, a ruptura com o amor: ao romper com o amor, rompi com o que mais amava.

Ora, há quanto tempo não me sinto tão cansado?... Há quanto tempo não me permito dizê-lo?... Há quanto tempo só tenho chorado por desespero... por confusão?... Porque antes, noutro tempo, noutra vida, eu ainda podia chorar em silêncio, ao som surdo da minha jugular; e meu coração batia a ponto de ferir!... Ah!, meu coração, como batia!... Com violência e estrondo!... E fui feliz!... Ah!, como fui!... Como jamais imaginara possível... Oh!, mas, então, a grosseria! Que grosseria! Que estupidez! Que indecência! Que sacrilégio!... Ah!, não podia ter razão!... (Jamais!) E havia de se arrepender!... E eu perdoava imediatamente, de todo o coração, em prantos; com as lágrimas que ainda guardo... que fazem parte de mim... que às vezes derramo por acidente, quando transbordam...

Mas meu respeito foi mais forte. Transformei meu santuário num mercado, grosseiro e sujo, cheio de vozes e buzinas, estúpido como minha ofensa. E não tive paz, mas encontrei sobrevivência. Então a algazarra silencia... e noto o vazio pungente que brota do altar... Então me levanto... e vejo a fé, outrora agonizante, transformar-se no lenço prateado com que lustro um tesouro, o relicário do amor que se tornou em saudade. Afinal, volta a haver espaço para amar. Para amar até o fim, nem que seja à própria vida.

Decreto nº 4

Fica revogado o Decreto nº 3.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Decreto nº 3

Fica instituído o Piloto Automático.

Literatura

Voltei a assistir ao Death Note. É engraçado como Yagami Raito se parece com Raskólnikov. Ainda mais engraçado é como me identifico tão intensamente com ambos. Talvez seja uma boa idéia começar a ler meu Entering Normal, que já chegou há muito tempo...

Sétimo princípio

Praticidade.

Decreto nº 2

Fica revogado o Decreto nº 1.

Hipótese

Convém ter princípios.

domingo, 2 de novembro de 2008

Hipótese

Muitos males são frutos do ócio.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Comentários aleatórios

Então, uma coisa muito agradável que me acontece com Dostoiévski é a hora de parar: simplesmente começo a pensar e paro. Sempre é por conta de alguma coisa de suma importância em minha vida que é suscitada, mesmo que não tenha nenhuma ligação aparente com o que acontece com Raskólnikov. (Talvez haja um limite na quantidade de alguma coisa a que meu espírito é capaz de suportar, além de que é ativado algum mecanismo de restabelecimento...) Hoje, por exemplo, estava decidido a terminar o livro, mas, num momento aparentemente qualquer, no meio dum parágrafo, me deparo subitamente com alguma coisa do meu cotidiano, com o que me prendo por mais de uma hora. E fiquei feliz por ter imediatamente abandonado o livro sobre a mesa, pois sabia que já era a minha hora, a da minha própria vida, a do meu próprio cotidiano; que dificilmente voltaria a ser a hora dos problemas do protagonista de Crime e Castigo. Desta vez, a nenhuma "grande conclusão" cheguei; fiquei feliz, assim, apenas divagando, pensando em alguns breves diálogos que tive hoje por meio de mensagens instantâneas, ao som da minha própria composição — aquela de que mais gosto — cantada por mim mesmo e devidamente arranjada, como só em pensamento seria possível. Mais tarde, de livro ainda fechado, quando senti que era a hora de ir-me embora não me fiz de rogado: apenas vesti o capacete e vim. Desta vez não foi nem o enfado nem o entusiasmo o que me moveu, mas a simples vontade; tudo muito leve e natural. Talvez uma conseqüência da "abolição dos princípios"...

Meu lance com Raskólnikov aos poucos vou entendendo melhor. A tensão se desintensifica; permanece aquilo que há de mais sincero — o que raramente é o mais emocionante. Fica-me, então, mais claro aquilo de que eu já suspeitava há cerca de uma semana, quando a leitura estava ainda mais ardente... — Também, pudera!, naquela época o sentimento do próprio Rodion era mais intenso e, assim, mais havia na fonte de que eu me deixava voluntariamente contaminar. É muito mais tranqüilo agora, quando já se aproxima o final, o qual conheci já há alguns anos (embora numa tradução triplamente indireta: russo—francês—português—mosaico); afinal, ainda, não deixa de haver certa esperança de que nem tudo esteja perdido, muito embora as mesmas perspectivas redentoras já tenham sido consideradas desgraçadas noutro tempo... Resta a mensagem sobre os apesares; sobre o que pode ainda haver de bom... Resta o recurso da própria vida, cujo valor é a priori, independente das circunstâncias... Assim, como se caso houvesse duas pessoas que se tivessem decidido ao suicídio, a primeira fã do Aquaman e a segunda do Spiderman, seria óbvio que esta escolheria o prédio e aquela ao mar. — A proposito, la vita è bella!...

No trabalho foi também um dia especial. Com as ferramentas de que disponho hoje, seria muito difícil (e até mesmo injusto) mensurar minha "produtividade" de horas atrás. Isso porque, creio, essas ferramentas sejam convenientes para comparar máquinas. — Aliás, é também sobre isso minha mais agradável conclusão de hoje, que eu formava enquanto descia as escadas do prédio rumo ao bar e ao Dostoiévski:  "A função mais humana que existe é a do palpiteiro." Eis o que quero ser quando crescer!... É o que fui hoje, quase bem o suficiente: bem quase a ponto de não me sentir culpado por não ter sido, como de costume, uma boa máquina.

Decreto

Revogam-se todos os princípios.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Observações preliminares

Acontece comigo, às vezes: não vou com a cara do cara. Aconteceu-me com René Descartes, não somente pela fragilidade das suas duas primeiras conclusões (e também de muitas outras), mas principalmente pelo estilo literário que encontrei nas duas obras a que tive acesso, especialmenete no Discurso do Método. Afinal, como não fui com a cara dele (ou com a do tradutor), pouca coisa guardo de suas idéias. Mas, ainda assim, lembro-me dele com carinho, por conta da sua teoria sobre a evidência.

A importância que Descartes dá à evidência beira o religioso — com o que fiquei fascinado. Antes de meu contato com ele, ainda não havia concebido a razão como religião, nem mesmo hipoteticamente. Depois, mais tarde, andei me esbarrando com alguns teóricos do catolicismo e ouvi falar da proposta da Teologia; tudo, aliás, coisa que sempre rondou meu cotidiano, mas a que então não havia dado atenção. De certa forma, não deixo de ter sérias reservas quanto ao "critério da evidência" de Descartes, já que tanta coisa me aparentou ser fantasiosa na parte de sua obra que não se restringe à matemática; mas, por outro lado, muito me seduz a idéia de ser capaz de reconhecer a verdade, como se ela emanasse das proposições, à espera de alguém capaz de captá-la. Fico seduzido como Raskólnikov com seu Napoleão Bonaparte — e talvez tão gravemente quanto.

Por fim, com todas as reservas quanto à infalibilidade da evidência (ou do que quer que venha a receber esse nome), como bom partidário da dúvida metódica, adoto o princípio da evidência como guia, já que a verdade, se existe, é forçosamente evidente. Assim, deixo as ressalvas apenas para quanto à minha competência material de reconhecê-la completamente — uma porta desimpedida para a reconsideração.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Crítica de princípio

Por que sentir culpa?

Apologia da etiqueta

Gosto de coisas bem-feitas, ainda que não o pareçam à maioria. Gosto de coisas sinceras, mesmo que sejam mentiras (lembrando da afirmação do Cazuza). Quase não me interesso por política, mas freqüentemente tenho me deixado fascinar por marketing. Até lamento por não ter observado melhor a campanha de Leonardo Quintão, pois, se eu o tivesse feito, certamente me teria sido mais interessante assistir à paródia encenada pelo Tom Cavalcanti. De qualquer forma, alegra-me a eleição do Márcio, pois tenho por ele algum sentimento simpático parecido com o que sempre tive em relação a José Serra (que talvez tenha tido a mesma orientação marqueteira). Gosto de aparências, que, bem barbeadas e penteadas, não deixam de ser formas de arte.

Digo isso a propósito da Malu, que vejo que mais me surpreendeu por parecer boa. Ela consegue ao mesmo tempo parecer e ser (preciso ressaltar). Não deixo de ter também certo sentimento de lamentação pelo fato de ela não se esforçar tanto pela aparência nas execuções ao-vivo. Chega a me sugerir que seja uma musicista de estúdio, como a Adriana Calcanhotto (segundo a vi dizer em uma entrevista), embora sem aquele pavor pelas gravações ao-vivo. Certo tempo atrás, cheguei a estar certo de que só conhecemos a qualidade de um músico quando lhe assistimos ao-vivo. Pensando assim, a Legião Urbana perdeu comigo alguns pontos — o inverso do que ocorreu com o Barão Vermelho, a que assisti numa edição do Pop Rock Brasil com meu pai. Já não sou tão radical nessa questão, mas ainda não desisti por inteiro da hipótese. É realmente engraçado como alguns músicos parecem desdenhar a apresentação ao-vivo, ao julgar pelo decaimento da qualidade. Suponho que isso se deva a alguma instabilidade artística; a alguma dependência de alguma coisa contingente, que precise de algum estímulo paciente e talvez solitário, que melhor combine com o estúdio que com a correria do palco. Há também outros elementos possíveis, tais quais o entorpecimento causado pelo álcool ou por outras drogas, a qualidade técnica do equipamento e das instalações, o nervosismo (menos provável) e, pelo outro lado, a tranqüilidade e o estojo de maquiagem que se encontram em todo estúdio. São, todos, efeitos dignos de nota e certamente incidentes, mas não me parecem suficientes para justificar a tão grande diferença de qualidade que se mostram em alguns casos, como ocorre com a Malu ainda mais que com a Adriana.

Quero ter a oportunidade de assistir a uma apresentação intimista da Malu. Não me refiro ao intimismo do ponto de vista estritamente musical, mas quanto ao estado de espírito. Pode ser que ela cantasse mesmo Retrato Perfeito nessa ocasião. Mas eu gostaria de assistir a um estado de espírito como o que acredito presenciar ao ouvir Filos, na gravação em estúdio. Até fico incomodado ao sugerir uma comparação com esta versão ao vivo. Sei que já havia mencionado essa questão noutra ocasião, com a música Retrato Perfeito, que conheci logo em duas versões no PalcoMP3; mas desta vez não estou falando como fã (embora também não faça nenhum esforço para o dissimular), mas como crítico, como filósofo-de-bar. O propósito deste texto é tratar da aparência, sobretudo. Afasta de mim a afirmação de que a Malu apenas parece! Mas é também fascinante como a mesma Malu é alternativamente cautelosa ou negligente.

Faço aqui uma apologia da estética — aliás, da etiqueta —, em detrimento da ética. E não me parece demais afirmar que entre a ética e a etiqueta, esta é a mais naturalmente artística.

domingo, 26 de outubro de 2008

Aprendizado

Alguns dizem que sou um cabeça-dura; que, quando meto uma idéia na cuca, tão cedo nada consegue retomar minha atenção. Na maior parte das vezes discordo discretamente, pois não sou assim tão teimoso e insistente, enquanto é relativamente fácil que algo me faça desistir de algum propósito. Mas há ainda algumas ocasiões em que discordo ardentemente, pois nem de longe sou tão teimoso como gostaria de ser, como decidi que serei. É que tenho algumas idéias nas quais creio, as quais caso se mostrem verdadeiras, revelarão grandes tesouros. Algumas vezes, gosto muito da busca por esses tesouros, tanto que me proponho a me dedicar a ela cada vez mais.

Dessarte me incomoda sobremaneira "a perda do fio da meada" — o que, lamentavelmente, me ocorre com bastante freqüência, talvez por causa de minha incapacidade de distinguir quantidade suficiente dos fatores que desencadeiariam o efeito cuja reprodução era pretendida. Pois, muitas são as ocasiões em que culpo a mim mesmo pela falta de empenho e, assim, dou início ao processo de cultivo de uma possível futura monomania. Mas, por fim, já suspeito que eu mais me dedique à própria dedicação que à coisa, o que torna o processo ao mesmo tempo mais árduo e menos frutífero. (O simples fato de reconhecê-lo já me parece representar uma esperança de sanidade. )

Mas não posso deixar de notar o desenvolvimento de minha estabilidade. Hoje foi um dia relativamente ruim: sonhei que havia enlouquecido, acordei irritado e passei quase todo o dia mal-humorado.  Mas mesmo o mau momento não foi muito semelhante aos outros, que já tanto houve; talvez a maior semelhança tenha sido uma sensação tátil, que — como imediatamente vim a me lembrar —, já me sugeriu a eternidade do sofrimento, como se por instantes (horas) intermináveis me alcançassem as chamas imortais do inferno. Mesmo em meio às características dificuldades mentais e motoras, desta vez o tormento foi suavizado mais rapidamente, num sinal de que tenho feito lá meus progressos...

O descanso de Osama

Então, neste domingo, já não tenho compromissos externos. Até teria ficado muito contente se não tivesse precisado de sair de casa, mas, infelizmente, a nossa democracia ainda nos obriga a comparecer à urna, nem que seja para afirmar que não sabemos em quem votar ou, pior, para declararmos que não estamos em nosso domicílio eleitoral. Nunca fui tão contra o voto obrigatório como hoje sou (ou estou).

Ainda não me está claro o que me significou o dia de ontem. Foi um dia bom; foi fantástico subir ao palco novamente, como integrante de uma banda; foram momentos divertidos, cheios de entusiasmo, com colegas que inspiram confiança e amizade. Mas, embora minha intuição vote contrariamente à existência de coisas indefectíveis, no momento ainda não estou em paz. De certa forma, sinto-me como um noivo que sobe ao altar tendo consciência de que não deseja que o casamento dure até que a morte os separem. Mas farei com que não leve muito tempo para que eu me conforme, pois não pretendo me deixar prejudicar pelo excesso de romantismo. Bem, algum romantismo talvez ainda convenha, nem que seja como medida cautelar, dada a fase de adaptação à aplicação dos novos princípios. Talvez nesta última observação esteja o principal argumento a favor do meu possível uso de um nome artístico alternativo — no caso, "Osama", apelido com que o cara das guitarras me surpreendeu logo em nosso primeiro contato.

Ainda não estou plenamente convencido de que "Osama" poderia me servir de tanto alívio. Talvez seja apenas uma declaração de protesto em relação à impossibilidade da minha satisfação completa. Incomoda-me isso também, pois eu poderia nunca encontrar a possibilidade de me apresentar como Lekso caso eu fique à espera de algum momento ideal, completamente ideal. Por outro lado, ainda, muito mais me incomoda a minha insegurança, que se manifesta em relação a qualquer coisa em potencial — por exemplo, em relação às minhas pretensões de vocalista, que não poderei satisfazer nessa banda. Bem, é apenas a insegurança (e também ainda outros pecadinhos)!... Pois, a imaginação é o limite!... — E finalmente estou descansado.

sábado, 25 de outubro de 2008

Post-scriptum

A esta hora estou cansado, após um longo dia de intenso trabalho, e, creio, não serei capaz de desenvolver as idéias neste blog como eu pretendia, há alguns minutos, ainda sobre duas rodas. Amanhã haverá de ser ainda outro dia de intenso (e sobretudo importante) trabalho; eis por que não desejo prolongar meus esforços contra minha natureza (ou contra meus hábitos) ainda mais que o que já tenho feito nos últimos dias — muito embora eu julgue estar ainda muito distante dos meus limites. Inclusive já não me seduz tanto, como antes, a idéia de lutar contra os limites — e eis um pensamento que me vem com sabor de vitória.

Por fim, a propósito da última máxima, inspirada na obra de Dostoiévski, pareceu-me pertinente esclarecer alguma coisa, que agora me escapa. Talvez mais alguma peça tenha se encaixado em minha mente, tão bem que já não posso distingüi-la da "massa original". Diante disso, dado o que já mencionei no parágrafo anterior, só me resta afirmar que sinto estar em um bom caminho, e que noto cada vez mais claramente o desenvolvimento da minha paz.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Sexto princípio

Se não há culpa, não há pecado.

Observações preliminares

A caminho daqui, cerca de dez quilômetros distante deste blog, pensei em escrever sobre algo inverso; sobre o desdém que tenho (ou que teimo em ter) em relação ao conhecimento que derive fundamentalmente da experiência. Dado o caráter claramente adversativo da frase anterior (e, inclusive, considerando a observação entre parênteses), parece-me até redundante afirmar que meu atual posicionamento é o oposto, nem que seja em relação às afirmações categóricas que eu formulava no caminho. Talvez seja porque me acostumei a tratar de minhas próprias questões com demasiada superficialidade — aspecto que bem deve estar presente nestas "novas" palavras — , além de subsistir a tal  necessidade de manter a dita "coerência interna" de meus discursos. Então, como nem sempre recorro ao subterfúgio das "fases", "momentos", "instantes", "eras", "horas" ou "idades", termino me sentindo tentado a manter, ainda que em meu próprio prejuízo, conclusões ou deduções que, com um pouco menos de desespero, bem poderiam ser substituídas por outras mais adequadas às minhas descobertas.

Percebo agora, depois das curvas mais enfáticas da rodovia estadual e, especialmente, depois de outros eventos mais simples (e menos a propósito do cartão-de-visitas), que o empirismo é fundamental. Pois, de início pensei em lhe emprestar a palavra "primário", com o propósito de subjulgá-lo, como se fosse o empirismo algo temporário, um degrau, uma etapa a ser superada rumo ao racionalismo utópico a que me senti obrigado a defender diante dos conceitos de "Renascença" e "Idade Média", a que já tanto me referi neste blog. Pois, venho afirmar que o empirismo é o conhecimento por excelência; em última análise, qualquer outro método só se consagra por ele e enquanto tiver seu aval.

É verdade também que eu poderia me esconder, evitando assim o constrangedor "pedido de desculpas"; afinal, as novas idéias poderiam facilmente se enquadrar no perfil "renascentista" — além de que empirismo e racionalismo não são conceitos necessariamente excludentes. Noutra ocasião talvez eu até discutisse a questão comigo mesmo um pouco mais antes de escrever aqui minhas impressões; assim seria, não fosse meu desejo de registrar necessariamente agora minhas descobertas (não inteiramente novas, mas especialmente mais nítidas), contemporâneas ao meu contato com Raskólnikov.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

O sonho

Tenho alguns, poucos, planos; a maioria seria melhor chamada de "hipótese" — no máximo, de "planos hipotéticos". Expectativas tenho um pouco mais freqüentemente, e as tenho aproveitado com objetivos lúdicos; até procuro atraiçoá-las primeiro, antes que elas mo façam. Já não tenho tido muitos sonhos — especialmente desde que passei a valorizá-los muito —, mas um sonho importante me ocorreu há pouco tempo.

O tal sonho me fez supor que a diferença entre a realidade do sono e a da vigília esteja apenas na intensidade. Na intensidade de alguma coisa incerta, é verdade; mas, ainda assim, apenas em intensidade. Na essência, é tudo o mesmo lance — inclusive o lado acrobático da coisa —; tudo a mesma realidade...

Para atingir a perspectiva que acabei de propor, a "realidade" deve ser concebida subjetivamente, é claro. Inclusive passei muito tempo julgando que essa observação seria desnecessária; mas tenho notado que a crença no "mundo real" tem muito mais adeptos que o que me parece verossímil. Tem muita gente por aí vivendo no seu próprio "mundo real". Às vezes até me parece ser uma crença útil. Útil e, especialmente, cômoda. E já estou começando a me acostumar a valorar "comodismo" como algo bom. Afinal, por que algo cômodo haveria de ser invariavelmente mau?! Mesmo por que, afinal, tudo o que se estabelece é cômodo... E, de certa forma, uma longa temporada num hospício talvez não seja algo assim, tão... tão inconvenientemente incômodo... Aliás, qualquer lugar pode pertencer ao mundo real... ou não... conforme convir... ou for cômodo...

Mas agora voltemos ao sonho! Aliás, tive uma idéia melhor: vou voltar a ele sozinho. — Boa noite!

Comentário

Bem, é claro que há muita bobagem nesse post. Assim entenda-se por "bobagem": "aquilo que não interessa". Minha ocupação e, muito especialmente, minhas preocupações eram outras naquele tempo. Era o tempo das primeiras cruzadas!... Kkk!... Hoje é tempo de Rousseau!... Kkkk!!!... Tudo tão próximo da Idade da Pedra!... Kkq... q... ...

"A perfeição só é possível na ausência do tempo." Ponto para Sidarta, que sabia das coisas!... Tendo isso em mente, é impossível não saber respeitar.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Café com namoro (Republicação)

Belo Horizonte, 6 de maio de 2006.

Recentissimamente, descobri que minha mente é bastante diferente do que costumo — ou costumava, ao menos — adjetivar de "normal". Neste momento, até me surge a oportunidade de aprender a me amar mais, verdadeiramente. E a notícia mais animadora das minhas últimas 24 horas é minha loucura. Alguém, certo dia, me perguntou se eu estava ficando louco — e me senti ofendido. Agora, estou em paz, e minha loucura se torna motivo de grande alegria.

A normalidade nunca me atraiu — ou, pelo menos, não me lembro de nada nesse sentido. Odeio a mediocridade — e a isso se deve a maior parte das vezes em que odeio a mim mesmo. Para mim, mediocridade é íntimo amigo da normalidade; ser normal é ser medíocre. Eu me amo por ser louco. E sou mesmo louco e doente e mau — além de egoísta, o que eu já sabia há séculos. E eu quero ser cada vez mais egoísta, mau e louco. E quero parar de me esforçar para ser aquilo que vocês querem que eu seja. — Mas, por favor, continuem me pressionando, pois isso é um bom tônico para minha companheira mais fiel, a insanidade.

Neste momento, o café é também grande e adorável companheiro. Adoro essas coisas esquisitas, que nos provocam o sentimento de amor e ódio. Gosto da oportunidade de passar por coisas que ofendam minha idiotice, como essas necessidades idiotas de dormir, comer ou "ser feliz". O café me passa a impressão de que não vou conseguir dormir, e me dá o estranho desejo de bebê-lo até eu perder a noção de se estou tonto ou apenas com os olhos molhados. E há a dor-de-cabeça e o enjôo, de que gosto menos. Mas que mal há? É sábado, então até posso sentir enjôo; ao menos, não preciso me importar com o que os infelizes segurados do INPS vão falar quando eu me levantar daquela porcaria de guichê para tomar o meu querido café. E que eles entendam o recado do INSS: morram pobres e cedo! — Ah, mas acabo de me lembrar de que o estoque de café institucional acabou; então, morram alguns dos meus colegas cafezeiros daquela também infeliz agência, para que me sobre mais café!

Estou cansado de lutar contra minha loucura. Estou cansado de tentar não falhar. Estou cansado de tentar ser diferente do que sou. Estou cansado de tentar ser sincero. Estou cansado de tentar convencer vocês de que eu sou alguma coisa que presta. E eu amo o cansaço, assim como o café.

Certo dia, alguma bia me disse que há um belo arco-íris depois do cansaço; e que há lá um belo papagaio a disparar considerações sobre si mesmo; e que há lá também um belo maestro que encanta uma platéia paralizada por sua orquestra desafinada pelo papagaio; e que essa platéia se encanta com o maestro, o papagaio e, sobretudo, consigo mesma; e que, depois desse belo arco-íris, cruzada a imperceptível fronteira de um novo dia, descobrir-se-ia uma intensa e branca e falsa paz doméstica, que anunciaria um tirano e apaixonante horizonte de belezas e horrores. Por causa disso, um dos setores secretos do meu agora ardente coração possui um intenso carinho pela Segunda Divisão do Brasileiro, e amo o cansaço, o café e o traiçoeiro arco-íris. Por causa desse amor, até quero me esquecer de que beatrizes mentem, apesar de elas cometerem o multi-afiançável crime de fazerem-no ainda mais que eu mesmo.

Atualmente, considerando que nos últimos anos tenho desesperadamente procurado algo com que eu sempre possa contar, minha nova namorada é minha loucura. Ela me ama mesmo quando infielmente me esqueço de sua presença. Um dia, até pensei que ela fosse ciumenta, mas aquilo que vi era simplesmente ela mesma, que possui infinitas caras. Namorá-la é como estar rodeado por infinitas mulheres misteriosas e misteriosamente apaixonadas. E tanto sou mesmo ignorante e incompetente que diversas vezes rejeito uma sua bela face por não reconhecer sua beleza misteriosa, sempre muito maior que minha atenção. Se ela continuar assim, compreensiva, talvez nos casemos futuramente. — Ela até fez um aborto na semana passada, de um filho que eu não saberia amar, mas parece que já está grávida novamente. Uma atraentíssima característica da minha loucura é que ela não se importa com o aborto, nem com o infanticídio; continua sempre presente, com suas infinitas caras.

Resumidamente: estou muito bem, mas com muitas saudades.

Carinhosamente,


Lekso

Cafeína russa

Raskólnikov é meu irmão. Sinto isso quanto mais o conheço. Bem, é sabido que não sou daqueles que teimam em não se deixarem apaixonar. Na realidade, a frase anterior é, antes, mais um de meus eufemismos. Mas, nesta fase de irmandade com Ródia, sou indeciso quanto ao que sinto sobre minhas esquivanças, assim como quanto a quaisquer outras das minhas firulas habituais. Desdenho a tudo isso, agora. Resta saber o que permanecerá após o fim da leitura.

Este momento é outro daqueles regados a cafeína. Pois, acabo de perceber que ainda não republiquei Café com namoro, de 2006 — o que é um problema muito fácil de resolver. Fico pensando sobre o que aquela época me significou... Especialmente quanto ao sentimento de euforia, que aprendi a temer — o que mais marcou aquela fase. Lembro-me de algo que me disseram numa aula de artes, ou de história, ou de piano: que os movimentos, as "eras", são denominadas por aqueles que as sucedem. Pois, assim me sinto: como quem, embora sobrevivente, seja também sucessor de suas próprias eras. Neste momento, a denominação e o julgamento não me parecem algo digno de nota. Mas creio que convenha relembrar...

Quinto princípio

A imaginação é o limite.

Post-scriptum

Estou feliz por estar em novembro. Mais feliz ainda por estar em outubro. Afinal, setembro já passou e ainda tenho algum tempo para acreditar que o próximo ano será melhor. (Não que eu leve isso a sério... Mas também nunca tinha acreditado em data de aniversário...)

E, com a greve da Polícia, a corrupção explícita já contamina o novo blog... S.O.S.!!!

Em casa há algumas horas, mas ainda insatisfeito; ainda espiritualmente pendente. Naveguei pelas curvas semi-nuas da Via Expressa... pelas notícias sociais do Yakult... pelos "spams tolerados" do GMail... pela coca-cola envenenada do Seu Paulo... pelos planos, projetos e providências... Nada!... Do, jen nun la adoleskanta Lekso Pozŭaho spirita krizo! (Ou, em palavras mais simplesmente "homeopáticas", the book is on the fuckin' table, freak!)

A duras penas vou convivendo com a reiterada conclusão de que a ignorância não é uma estratégia bem-sucedida. Suponho, aliás, que eu tenha alguma idéia relativamente solidificada sobre o que viria a significar "sucesso" — o que é uma suposição, no mínimo, razoável. Pois, sei que preciso de um pouco de ar... de um pouco de descanso... de um pouco de colo... Sei que preciso de um pouco de fé... de um pouco de respeito... de um pouco de carinho... São apenas idéias, sentimentos... Coisas que mudam, também... E são coisas reais; mais importantes, talvez, que o que costumo dizer apenas metodicamente que "talvez"; tudo assunto muito sério...

Gostaria de saber por quê. Mas não me incomodo muito, a ponto de querer esmiuçar. Esses pensamentos são um tanto mais profundos que a esfera em que vivem as coisinhas que me excitam a vaidade. Bem, talvez seja por isso que este texto esteja no blog errado. Afinal, não espero mesmo que ninguém mais entenda. Eu entendo (não que isso ajude): é tudo sobre uma solidão que ainda tento crer que vá passar... sobre os fragmentos da mais bela estrela cadente... Tudo sobre o nada que há agora além de uma saudade pulsante...

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

A decisão

Tive que decidir se tenho tempo ou não. Ora!, é preciso ter tempo para poder decidir!... E, como sinto grande necessidade de poder qualquer coisa; apesar de meus tormentos e devaneios; diante de minha (pouca) fé na lógica; decidi: — Foda-se a pressa! — Foda-se a pretensão de utilitarismo! — Fodam-se os Nem Secos! — Sou contrabaixista!... E, o cara das baquetas, eu sei quem é!

(Tenho o tempo necessário.)

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Antítese

A perfeição só é possível na ausência do tempo.

domingo, 12 de outubro de 2008

sábado, 11 de outubro de 2008

Anne LeClaire

Li uma versão adaptada, reduzida, de Entering Normal, logo após concluir a leitura do livro que o precedia na coletânea do Readers Digest. Na ocasião, estava ainda muito cedo para dormir, mas não consegui largá-lo até terminar. — Um livro maravilhoso.

No dia seguinte, estive pela primeira vez sozinho no shopping center em que assisti ao cinema pelas primeiras vezes. Lembro-me de pelo menos dois filmes: O Máskara e Titanic — o que dá idéia de quanto tempo faz. Eu só havia estado nesse shopping acompanhado de meu pai, inclusive mais recentemente, num dia em que ele veio me visitar aqui em Belo Horizonte. Voltava lá agora para conversar com uma amiga do trabalho sobre seus problemas profissionais, tornados pessoais. Provavelmente teríamos conversado como era pretendido, mas acordamos tacitamente que não convinha discutir aqueles assuntos na presença do marido, que desde sempre teve sua opinião sobre a forma de os resolver — justamente a solução que queríamos evitar. Pois, as férias lhes farão bem.

Mas muito me alegrou a idéia de poder procurar na livraria outras obras de LeClaire. Dos livros que tenho lido recentemente — entre best sellers, clássicos e outros menos divulgados —, Sinais de Vida (Entering Normal) foi especial. Definitivamente não o foi por conta da elaboração da trama, nem pela originalidade do tema; mas porque nenhum outro romance conseguiu me estabelecer tamanha ligação emocional. Ao mesmo tempo, foi a melhor redação que já vi de autor americano. Claro, era obra traduzida e resumida, mas quis conhecer mais.

Chegando na livraria do shopping, perguntei por Anne LeClaire. O computador não encontrou nada. Até encontrou um Leclaire, mas não minha Anne. Saí de lá frustrado, mas não de mãos vazias: adquiri Crime e Castigo na tal tradução direta do russo. Levei para casa ainda a sugestão de pesquisar num tal de Estante Virtual, onde eu poderia encontrar minha Anne nalgum catálogo de sebo. Claro, meu espírito tem sede do que Dostoiévski tenha a me dizer; mas, mais ainda, hoje, tenho sede de Anne.

Em casa, a Estante Virtual me indicou apenas outro livro, também em coletânea do Readers Digest; o mesmo de que já me alertara o Google. (Na verdade, indicou também a versão original, completa, em inglês, do livro que tanto me encantara.) Não fiquei satisfeito com outra versão resumida — tinha de haver uma versão completa! E, como não consigo sair ileso de um sebo, meu novo dicionário de esperanto-português deve chegar em minha casa na próxima semana...

Por fim, voltei ao site oficial da escritora e procurei informações sobre suas traduções. Não encontrei nada a respeito. Mais tarde, eu receberia a resposta, carinhosamente assinada por Anne LeClaire, de que suas duas únicas traduções em português estão nas versões resumidas do Readers Digest. Nunca tive, como agora, tanto desejo de aprender inglês...

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Enquanto a roda escapava do mundo das idéias...

O erro é mais notório que o acerto. (Ponto para Murphy ou para a etiqueta?)

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Sinais de Vida

Esta noite passei na companhia de Anne D. LeClaire. Quero conhecê-la melhor. Sei que vou. E que não a esquecerei.

sábado, 4 de outubro de 2008

A Salvação

Não faz pouco tempo que ouvi falar da correlação entre a expectativa e a decepção. Lembro-me de um livro de um dos alardeadores da PNL. Faz sentido. É o que explica boa parte do que um tempo atrás chamei de "onda" — a alternância entre meus bons e maus estares.

Não chego a temer as boas sensações, as que me fazem desejar que sejam eternas. Algumas têm sua constância, embora isso não seja comum em sensações de maior intensidade. Eis mais uma chave sobre meu "período medieval", que ainda me exerce tanta influência. Meu ponto fraco ainda é a busca pela Salvação.

[...]

Ontem estive conversando com um cara bacana, que no meio da conversa lançou a perspectiva das características dos pontos das pessoas. Ele disse que seu ponto fraco era mulher. Fiquei ruminando: — Pode ser bacanamente possível fortalecer o ponto fraco. Mas, supondo que um "ponto fraco" pudesse não ser invariavelmente fraco, então teria de ser apenas uma palavra. Decidi-me por "ponto-fraco" — afinal gosto da palavras compostas em que as componentes mantém sua independência fonética. Nunca gostei de exceções, menos ainda de adivinhação. Pois, "ponto-fraco" é melhor. Meu cachorro era o Toco, um pastor belga; minha guitarra é a Sotustra, uma Washburn Lyon; minha motocicleta é a Fernanda, uma semi-esportiva acessível; meu ponto-fraco é a Salvação, que, pelo jeito, também deve de ser mulher.

[...]

Estou aqui experimentanto a música do Tiro Williams, que conheci na véspera do dia em que me desiludi com a Malu. Eles estavam lá na ocasião mesma, também. Pena que a qualidade de áudio do II BH Indie não seja lá essas coisas. Ou que talvez eu não tenha tido tanta sorte. Bem, não quero dizer que o som seja ruim, mas se aquilo fosse um show de música industrial de um selozinho qualquer, certamente teria dado pra entender o que as letras diziam. Se é que dissessem algo. Ainda bem que as letras da Malu eu já conhecia muito bem. 

Enfim, agora que me é possível ouvir as letras do Tiro Williams, gosto muito; especialmente da canção Painter Jane, que também está lá no MySpace. Daqui a mais 50 execuções, o número de Painter Jane ficará maior que o de A Despretensiosa (o que, conforme minha verdade-de-momento, será muito merecido). Tenho também o cedezinho, que comprei naquele sábado; então, se Painter Jane nunca chegar a ter mais ibope que A Despretensiosa, é culpa do cedê...

[...]

Pois ontem tive uma decepção considerável. É que a Salvação veio me visitar, foragida da Idade Média. Ela sacou seus encantamentos, que encontraram meu espírito previamente amolecido pelas 36 horas de vigília do meu corpo. Pois é; muitos horrores nascem do cansaço (e da solidão). E dado que todas as sensações aparentadas com a decepção são catapultados pela expectativa, esta que é o mais apurado feitiço daquela bruxa...

Enfim, estou cansado e triste. Amedrontado, em parte. Como ainda sou muito ganancioso na arte de especular sobre a minha vida, eventualmente ocorrem estouros de bolhas, como tem ocorrido com o mercado americano. Daí, a frustração, certo abatimento e, nos casos mais graves, a prostração. 

Sei que nenhuma escolha é irrevogável. Por outro lado, eu apostaria muito alto que morrerei sem ter força suficiente para levantar com um só braço minha moto sem sofrer uma grave lesão muscular. Em todo o caso, aqui estou a desenvolver minhas humildes roldanas...

domingo, 21 de setembro de 2008

Desencantamento

Hoje descobri que a Malu não é perfeita.

Eu que arranje outro ídolo; alguém que me sugira perfeição. Talvez eu ainda precise de heróis!?...

Embora minha razão já soubesse preliminarmente, deixei-me deixar levar pela paixão. E fui apaixonado como uma criança; alegre e entusiasmado como uma criança apaixonada; ingênuo como uma criança alegremente apaixonada... Como uma criança, alegre e apaixonadamente...

Pois, ela é boa demais para ser idolatrada; boa demais para ser perfeita; boa demais para ser mais que simplesmente muito boa. 

Adeus, velha Malu! (Acho que não sentirei sua falta.)

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

A Dama Dourada

Ainda bem que fui bem claro quanto à minha indecisão sobre pôr ou não aspas no meu pedido de desculpas. Ainda bem. Pois, o que eu faria agora? Poria ou desporia? Não sei. Desculpem-me. (Ou não.)

[...]

Tenho pensado muito em algumas conclusões que tomei numa sexta-feira de fim-de-ano. Foi enquanto a ex-primeira-dama ainda não se dizia "ex" (talvez apenas o pressentisse). Alguma coisa mudou de lá pra cá. Mais que isso: muita coisa mudou a partir de lá. Muitas coisas boas dificilmente teriam vindo. A Malu, por exemplo, em sua faceta que me é mais fascinante, me sugere em muito minha Dama Dourada.

Naquela noite em que o trem descarrilava e eu procurava por algo em que me agarrar, a Dama Dourada me apareceu como amiga. Teria sido até hoje excessivamente invasiva, se não fosse amiga a ponto de poder ser sinceramente perdoada. Creio que deve lhe passar desapercebidamente o efeito de algumas das suas sugestões. Talvez ela não suspeite do quanto dela há em "Os Filósofos da Via Expressa" — texto que trata da mais profunda conseqüência de que já tomei consciência, decorrente de uma conversa-de-bar.

Hoje tive uma breve conversa com o cara das baquetas. Então notei que aquela conversa com a Dama Dourada não foi completamente digerida. Parece-me que há ainda muito o que aprender em relação a isso. Talvez o suficiente para alguns anos. Ela me perguntava, em tom de sugestão: "Por que você não participa da festa?" E, em resposta, eu saía, em busca de um pouco de ar estrategicamente impuro; fugia da festa. Creio ter, depois, aprendido a participar. Creio ter, com isso, ganhado mais que perdido. Ainda não sei.

[...]

Então, voltando à Malu: consigo distinguir em minha admiração por ela três faces, que se entrelaçam: uma em relação à beleza da sua música; outra em relação ao seu modelo; outra em relação ao meu coração, que encontrei partido nos destroços de um trem descarrilado — a face mais notória. Mas outra me aparece ainda sem suficiente nitidez: a face da perpetuamente Dama Dourada.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Ontem eu falei com o Thiago; hoje eu assisti à Malu (Ou, simplesmente, "Rascunho")

Hoje estive no A Obra pela primeira vez. Mais que isso: hoje vi a Malu e troquei com ela algumas palavras. Ouvi ao vivo muitas das canções que costumam animar às minhas madrugadas. E o cara das baquetas estava lá.

Surpresa não tive. O pouco que pude perceber no meio de minhas toneladas de expectativas esteve na curta faixa do presumido. Foram muitas as expectativas; e muitas, as reservas. Mas, afinal, mais as tive quanto ao fato de se eu compareceria ou não. (E o cara das baquetas estava lá.) Nem tanto mais esperei da Malu. O som não estava tão bom, nem eu estava em tantas condições de curti-lo. Até troquei com ela algumas poucas palavras, mas — porém, entretanto, não obstante, todavia, contudo, enfim —, nada muito além do presumido. Eu não esperava mais que o que vejo ao acessar o PalcoMP3. Seria demais esperar. Por um lado, confirmou a expectativa; por outro — e até contraditoriamente —, foi uma tremenda decepção. Não sei exatamente por quê, nem pretendo morrer frustrado se eu nunca souber. Continuo amando a Malu. Foda-se!

Bem, afinal, bem ou mal, ela falou comigo. E me disse coisas que ainda não decidi como usarei. Porra!, estou decepcionado pra caralho! No meio daquela festa, talvez melhor eu tivesse feito se parasse para simplesmente ouvi-la!; se eu escutasse, ao invés de gastar meu pescoço e meu verbo lesado! (Ou não.) Mas, por mais que eu deseje pensar diferente (e até consiga, em alguns momentos), ainda prefiro "Retrato Perfeito" em estúdio ao invés de ao vivo (ou não —  sei lá!). E a festa era mais simplesmente minha do que minha em relação a ela. Era a festa da ocasião. Poxa!, eu fui lá: isso é algo relevante. Geralmente não consigo fazer nada que me seja realmente importante. Geralmente me escondo. Geralmente prefiro deixar passar e lamentar depois. Mas eu fui lá. Eu vi a Malu e falei com ela. E o cara das baquetas estava lá.

[...]

Ontem falei com o Thiago. Mais surpresa tive ao conversar com ele. Talvez seja porque dele eu esperasse apenas a música; a arte musical. E ele é mais jovem; é verdade (apesar de eu até hoje dizer que não acredito nesse papo de idade). Mas, enfim, entre os contatos diretos que tive com grandes personalidades artísticas nos últimos vinte e quatro anos e trezentos e sessenta e um dias, mais me surpreendeu o Thiago. Não sei exatamente por quê, mas espero que, quando eu souber, saiba também aprender com ele. Thiago é um grande cara; mais que o que ele parece ser, tenha ele consciência ou não. E, apesar dos pesares, apesares e talvezes, não sei ainda qual dos dois é o melhor (aliás, não sei qual é o meu preferido; aliás, esquece!).

[...]

Enfim, curiosamente, tanto o Thiago quanto a Malu me causam algum tipo de identificação: o primeiro em relação à beleza do que julgo ser o meu passado e a segunda em relação à beleza do que julgo ser meu futuro. Ingenuamente, de qualquer forma; talvez, no fim, a mesma coisa. E o cara das baquetas não está longe...

terça-feira, 9 de setembro de 2008

O (") derradeiro (") pedido de desculpas

Coisa simples: por mais que eu deseje fazer algo definitivo, a única coisa que permanece é meu desejo de reformar. Talvez nem isso. Pois, é também por isso que nem tudo reformo. As contradições, aos poucos, também vão se tornando evidentes para mim. Ou não. Foda-se! (Mas permanece sendo foda...)

domingo, 7 de setembro de 2008

Complementação do texto anterior

Então, o que seria exatamente a "Renascença"?

Em diversos aspectos, tenho impressão de que, por volta dos meus quinze a dezesseis anos de idade, havia mais consistência e coerência em minha conduta, em comparação com o período que se seguiu. Naquele tempo, meu sistema de crenças era simples, cristalino, evidente; meus sonhos e objetivos eram precisos; minhas dúvidas eram apenas frestas à espera de preenchimento. (Aqui não estou negligenciando os efeitos da experiência, mas tratando de questão diversa e mais fundamental que a simples carga de conhecimento.) Pois, tal teria sido "o apogeu do Período Clássico".

Enquanto a filosofia se desenvolvia, minha autoconfianca inchava tal qual o Império Romano. Após um curto período de expectativa eufórica — convertida em decepção a câmbio paritário —, teve início a "Idade Média". Foi um período marcado pela busca do preenchimento das dúvidas através de emoções, tendo-se declarado a razão insuficiente. Tal qual a a História observa quanto à Filosofia na Alta Idade Média, em minha vida entraram em pauta conceitos tais quais "redenção", "salvação" e "fé", com predomínio desta sobre a razão. 

Na transição da minha "Idade Média" para "Era Moderna", há também elementos que podem ser comparados à Peste Negra, às descobertas decorrentes da Navegação e à Reforma Protestante. O texto "Futebol" pode simbolizar meu primeiro passo em direção ao "resgate da cultura clássica", enquanto "Os Filósofos da Via Expressa", o primeiro sinal de que a velha "Escolástica" começava a declinar.

Just be yourself

Fiquei me perguntando quais foram as razões das duas "republicações" anteriores. O sentimento de ironia que norteou a elaboração de  "Os Filósofos da Via Expressa", de dezembro de 2007, já havia sido citado neste blog, num post de 05/09/2008. Pouco depois, senti necessidade de republicar o texto completo. Então, veio "Futebol"...

Vejo que os dois textos — de fases bastante distintas — simbolizam momentos de bastante relevância na minha história. São marcos de alterações de postura, caracterizadas por poderem ser interpretadas como "enrijecimentos de posturas" (nesse ponto, muito menos acentuado em "Futebol", mas ainda assim), ao passo em que também simbolizam momentos de redenção, embasados em pólos maniqueístas distintos. Cada uma a seu tempo, ambas as propostas colapsaram (o que não é de se considerar uma surpresa).

Mas ambos os textos têm ainda a característica de apologizarem a postura racionalista: em "Futebol" isso ocorre nostalgicamente; em "Os Filósofos da Via Expressa", convictamente. Ao que parece, os textos foram postos aqui porque representam dois dos mais importantes elementos que compõem minha fase atual, a qual ainda poderá representar para minha vida o que a Renascença representa para a História.

Futebol (republicação)

Belo Horizonte, 2 de setembro de 2006.

Ingratas, as águas dos sentimentos! Como ousam elas se esquivarem de minhas arapucas?! Mas eu não desisto: sei que conseguirei domar a mim mesmo; a toda a realidade, ao belo estilo Neo.

Mil vezes me voltei para as insondadas águas de minhas venturas; lancei-me como flecha, à espera de tornar-me um tubarão, senhor de minhas águas. Assim foi, memoravelmente, em São Francisco, quando pela primeira vez observei que ainda sou dependente de meu ar; e que, mesmo intoxicado por ele, ainda lhe devia minha vida. Saltei, pois; pus-me como flecha; e antes mesmo que a água tocasse meus pulsos, tremi; saltei de volta à superfície, e já nunca tinha mesmo querido conhecer os abismos oceânicos. Registre-se esta censurável observação: sou teimoso, isso mais que determinado. Esperneio com certa desenvoltura; por isso, o risco de me sujeitar a fazê-lo já não me incomoda tanto assim. Agora tremo ainda e novamente; e, penso, terminei de espernear ainda no parágrafo anterior.

O desafio, Sotustra, é que voar é muito mais difícil que decolar; mergulhar é muito mais difícil que saltar. Talvez por autocompaixão, por preguiça ou mesmo por mediocridade, tenho passado a ter certo carinho pela palavra "medíocre". Pois veja só: não é a média o que instiga? Para superar, não é preciso estabelecer parâmetros? Pois, a busca pela superação, que tanto prezo, é meu mais certo atestado de mediocridade. Porque talvez, em São Francisco, não tenha sido exatamente daquele jeito: posso ter sim mergulhado, até onde meus tímpanos, pulmões e ossos permitiram; e posso ter voltado apenas para tomar um pouquinho de ar; para comprar algum livrinho de recordes que pudesse me fazer sentir acima da média e dos medíocres. Mas não seria a superação um assunto para medíocres? O Super-Homem talvez ria de seus idólatras — e, creio, não se interessa por livros de recordes.

Mas eu não sou o Super-Homem. Adoro medalhas. Aquele que penso ser é movido por coisas assim. Talvez se eu não tivesse sido tão magricelinho; e não tivesse sido tão ruim-de-bola na Educação Física; e não tivesse tido tanto medo de tomar uma bolada; e não tivesse nascido com aquele ridículo peito-de-pombo; e não tivesse tido que ouvir daquela minha bela coleguinha de classe, à arquibancada, que me faria bem se eu passasse a "tomar um café-da-manhã reforçado todos os dias"; assim, talvez, quem sabe, eu não tivesse me interessado por Nietzsche, ou por Chico Buarque, ou por Machado de Assis, ou por Duke Nukem. Por isso, talvez eu deva ao futebol (e à Fernanda Mara, por que não?) muito daquilo de que mais gosto, e de que mais gosto de gostar.

Certa outra figura da escola ainda muito mais contribuiu para minha "intelectualização". Na quarta-série, enquanto eu ainda estudava à tarde, nossa fila era formada no ponto mais alto do pátio; minha turma ficava naquele pequeno beco, ao lado da misteriosa porta que levava aos fundos da cantina e à casa dos cachorros. Numa das ocasiões, especialmente quando a fila celebrava o retorno à classe após o recreio, comecei a observar um garoto, o "marciano", que, assim como eu, era bastante magricela. Mas ele sabia se defender determinadamente; era um intelectual (!); todas as suas idéias e brincadeiras eram interessantes. Para mim talvez fosse um fim-do-mundo se eu é que tivesse aquelas veias verdes e aparentes ao lado da orelha; se eu é que fosse chamado de "marciano" por todos aqueles populares jogadores de futebol. Mesmo sendo ainda mais magro e talvez até pior jogador que eu, ele não faltava às aulas de Educação Física. Naturalmente, tornou-se meu herói; e, durante o curto período em que ainda estudamos juntos, foi o meu melhor amigo. Muitas das minhas chatices e manias atuais foram inspiradas nele, o primeiro "acima da média" que reconheci.

Daí em diante, a poesia e a música passaram a ser para mim algo mais que alguns meros instantes de distração. Só me dedicava àquilo que eu julgava fazer relativamente bem. Deixei inteiramente de comparecer às aulas de Educação Física, mas não fui por isso reprovado. Passei a faltar freqüentemente também às aulas das demais matérias, e consegui me segurar até o segundo ano do ensino médio.

Não mudei tanto.


Lekso

sábado, 6 de setembro de 2008

Os Filósofos da Via Expressa (Republicação)

Belo Horizonte, 22 de dezembro de 2007.

Estive em dúvidas ao começar a escrever esta carta; indecidido se me caberia afirmar tratar-se de outra noite tristemente solitária, ou se de um novo e doce começo de madrugada. Preferi esta última concepção, em homenagem à minha mais nova verdade; à minha feliz e promissora descoberta, obtida ao fim de uma festa comum, regada a cervejas de que não são a minha, a algum vinho talvez bom e a um acervo de pessoas aparentemente felizes, cujo riso ecoava no precipício da minha ainda ingênua solidão. Prefiro um sábado promissor, assim como é tal a vida que agora escolho. Belo Horizonte, sábado, 22 de dezembro de 2007.

Despendi eras inteiras procurando por minha beleza a priori; procurando por um Eu aprioristicamente amável. Procurei me despir ou exibir-me nos trajes mais inocentemente simples, na romântica esperança que houvesse em mim uma beleza essencial, inegável, bastante e suficiente para fundamentar o amor de segundas e terceiras pessoas. Procurei pelo amor e pelo perdão; nos outros, como se em Deus. Mas, como recitou o poeta, "se fôsseis deuses, então poderíeis vos envergonhar dos vossos trajes". Como a vida me força a reconhecer, não são deuses aqueles a quem tanto outorguei a carga da minha salvação; tampouco o sou. Minha velha nudez, afinal, nada passou de uma indumentária simploriamente démodé, que de nada me valeu. Dela já tive o bastante.

(...)

A estória que se segue me surgiu algumas horas atrás, enquanto, antes da confraternização de fim-de-ano, eu ainda me encontrava imerso nos problemas da solidão, da amizade e da vida. Uma estória prescrita, que registro apenas por motivos históricos. Inspirei-me em algo contado por meu irmão catarinense (salvo engano), em ocasião que já não sei precisar.

Era uma tarde nublada de sábado. O limiar do verão ainda não amontoava carros, pessoas e presentes. Um jovem motociclista trafegava alegremente na Leste-Oeste, cantando em homenagem a algum raso sentimento; costurava seu caminho como bem permitissem os largos espaços e as poucas buzinas; procurava pela faixa que lhe permitisse cantar mais alto. Na mesma pista, pela esquerda, aproximava-se uma jovem mulher, que também julgava conhecer da vida. Ela tinha menos pressa; por isso, reconheceu que não lhe cabia a faixa dos portadores de urgência. Entre o retrovisor e o volante, houve tempo demais; entre uma faixa e outra, tempo de menos. Alguns metros mais tarde, repousava o moribundo, cujo rosto não se podia reconhecer, mesmo já não portando o capacete.

Nessa ocasião, cruzavam-se os dois pedestres, que presenciaram o desastre na Via Expressa. Pararam e observaram, enquanto o finando e a ex-jovem se debatiam. Alguém buzinava incessantemente; outro perguntava pelo número do SAMU. A multidão se formava abiogeneticamente. A ambulância não chegou antes dos ambulantes, com seus comes-e-bebes.

Os dois observadores se compenetraram por severos minutos. O que primeiro venceu a paralisia de sua angústia falou consigo mesmo:

— Incrível!...

Minutos depois, também já mais aliviado, o outro o questionou:

— O que o senhor entende por "crença"?

Então, já visivelmente alheio à catástrofe, o primeiro:

— E o senhor, o que entende por "entendimento"?

Então, os dois se olharam nos olhos. Riram. Pegou cada um a sua Brahma. Foi assim o começo de uma nova eterna-amizade.


Lekso

Outra estória sobre o café

E, de tempos em tempos, me vem o café. Estranha espécie de redenção! Excelente exemplo de coisa! Ser misticamente sintetizador das características edênicas e infernais do "mundo real"! Tão difícil atingir as profundezas do sentimento que desperta!...

A mais importante lição deixada pelo café é a lição de qualquer droga: aquela que a vida repassa a quem ama sem ser amado.

Habilidade e contrabaixo elétrico

Talvez nunca tenha havido algo tremendamente bem-resolvido em minha vida. (E já não tenho tantas esperanças assim de que vá haver um dia.) Então, o baixo reaparece, meio que ressuscitado.

"Habilidade" é um conceito ao qual atribuo mais importância que o que me parece ser comumente atribuído. Às vezes até escracho: "Tudo é questão de habilidade." Cá com meus botões, procurando um exemplo pra demonstrar esse meu resumo da realidade prática, pensei em suscitar um choque de valores. Afinal, para que é preciso mais habilidade: para apreciar a Malu ou para apreciar alguma atração do SuperPop? Essa questão, comparativa, bem que pode ser respondida através de critérios valorativos; mas muito mais que reafirmar as maravilhas da música belo-horizontina (leia-se: "Malu"), pretendo prosseguir com minha apologia da razão (e a apologia da Malu fique pra outra ocasião). 

Numa noite dessa, enquanto praticava filosofia-de-bar, soltei minha máxima no contexto de uma discussão sobre o homossexualismo (que, aliás, tem cada vez mais partidários pela região): "Ora, isso é apenas questão de habilidade!" A réplica do cara das baquetas não pode ser transcrita, mas, afinal, não foi possível negar minha acertada. Pois, é outro exemplo típico. Sem hipocrisia: se eu tivesse tanta habilidade para, digamos assim, "apreciar pessoas do mesmo sexo que eu" quanto tenho para apreciar as mulheres; e se eu encontrasse um rapaz ducaralho (perdão pelo trocadilho...); e se a sociedade fosse menos intransigente (ou eu fosse tão indiferente às pressões sociais quanto às vezes tento parecer); enfim, nesses termos, se tudo isso, por que não "ser feliz"? (Ah, mas não me entendam mal: eu nunca experimentei, nem quero, nem vou, jamais, Zeus me livre! Até a maconha, que é socialmente aceitável, puxei mas não traguei... Juro!)

By the way, meu sistema operacional instalou uns patches aqui na minha cabeça que cada vez mais confirmam o "paradigma da habilidade". No bar, ontem, aconteceram algumas coisas surpreendentes, dentre as quais se destacou o ressurgimento do contrabaixo. A banda se tornou real. (Bem, ainda é uma idéia, mas agora, mais que "só uma idéia", é uma "idéia real"; ou seja, uma idéia localizada no plano das idéias que realmente pretendo tornar reais.) Então, assim, devaneios à parte, quem sabe esteja ficando mais próximo o dia em que dividirei o palco com minha Malu?

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

FCC, Thiago, Mallu e Malu

Por acaso, resolve o cara aqui voltar ao Fórum Cifra Club (FCC). Não sei de onde, não sei por quê. Então, como não poderia deixar de ser — taí a dica sobre "de onde" e "por quê" —, vai o cara reler as mensagens que enviou, checar se houve novas respostas ou menções às suas... 

Talvez antes disso tenha surgido a necessidade de tratar novamente dum velho problema, que reaparecia tão logo eu voltava a trabalhar com instrumentos virtuais. Na época, o FCC não me ajudara diretamente com o problema específico — terminei resolvendo sozinho —, mas de repente eu encontraria lá um esclarecimento adicional ou algo assim. É, deve ter sido por isso. Deve ter sido por causa de um sequencer que não gostava de Chopin.

Do fórum de gravação para o fórum de divulgação de músicas, foi uma coisa natural. Afinal já fazia muito tempo que eu postara aquele cover deformado do Jeff Buckley, até desistir (desgostosamente) de esperar por resposta. Abominava a idéia de martelar nos "Ups". Não poderia conviver com a idéia de implorar por um comentário. Reinava a "romântica esperança que houvesse em mim uma beleza essencial, inegável, bastante e suficiente para fundamentar o amor de segundas e terceiras pessoas". (Não posso deixar de observar que minha "teoria da beleza essencial", nunca inteiramente abandonada, retorna à evidência agora, também a propósito da minha recente descoberta da Malu Aires. Mas não sem notar o aparente paradoxo, já que ela é linda em todos os aspectos que pude avaliar.)

Enfim, desde que voltei a acessar o FCC, neste mês passado, tornei-me um visitante assíduo. Na realidade, apenas na questão que mais me interessa no fórum: o "Divulgue suas músicas". Talvez esteja aí uma demonstração de princípios. Algo como aquele provérbio tão citado pelos espiritistas, que seria a evolução do código de Hamurabi. Pois, faço questão de ouvir as gravações e de me manifestar. Submeto as canções a uma profunda avaliação crítica e posto a resposta, da forma mais amistosa possível. Exatamente como eu gostaria que tivessem feito em relação à minha gravação de um ano antes. Terminou que o único comentário que recebi foi em relação ao repertório, como faz o público inconveniente de barzinho que aplaude em começo de música, como quem vê o músico como um seu servidor. Nem tanto... Nem tanto. Mas, curiosamente, apesar de não ter emitido sua opinião sobre a gravação em si, o único que postou em resposta foi o Thiago.

Thiago Ramires me surpreendeu. Notei em seu trabalho uma beleza profunda, muito diferente da beleza meramente aparente, que andava me intrigando desde certa confraternização de fim-de-ano no Padre Eustáquio. (Hoje tenho impressão de que "é preciso ser uma metamorfose ambulante", mas de forma que a alternância não impeça a constância.) Enfim, estava lá um artista o qual, se eu estivesse alguns anos mais ignorante, eu teria dificuldades em reconhecer como tal. Em suas composições notei a abundância de algo cuja falta me distanciou da composição. Algo mais difícil e fundamental; algo que não é fácil de se aprender; algo que diferencia o simples trabalho da obra de arte. Em conseqüência, tornei-me seu fã, não obstante as diversas objeções técnicas, superficiais.

Uns sábados atrás ouvi falar na Mallu Magalhães. (Não posso dizer onde, porque fica feio um intelectual como eu admitir que estava assistindo ao programa do Huck.) E me aparece aquela coisinha de quinze aninhos com aquele rostinho delicado, pintado porque "sei lá". Em meus devaneios, imagino que a menina não tenha se incomodado um milímetro por ser aquele "peixe-fora-d'água", cantando sua própria canção escrita em língua estrangeira. Lá disseram que ela seria uma espécie de ídolo da internet (e parece que não está mesmo muito longe disso). Não sei. Fiquei mesmo encantado com a menina. Memorizei o seu nome (mais ou menos) logo na hora. Cheguei até a recomendá-la. Só anteontem, depois de uma breve conversa com o Google, parei para ouvi-la. Por pouco tempo. Ela é realmente uma gracinha; demonstra muito talento; faz um trabalho agradável; mas vou esperar por mais alguns anos antes de me tornar seu fã. (Foi a impressão que tive anteontem, pois neste momento o Chrome não está atendendo ao meu pedido de "Tchubaruba".)

Pouco depois, enquanto naufragava suavemente, esbarrei com o "BH Indie". Tanto o Fórum quanto o Thiago e a Mallu (no Huck) haviam contribuído em muito para reacender meu nunca totalmente abandonado interesse pela carreira musical. (Há também de se considerar a violenta influência da série de "encontros de músicos" de que eu participara nos últimos dias.) Uma equipe que promova o trabalho dos músicos independentes de Belo Horizonte, que excelente notícia! À frente, a Malu — minha maior descoberta musical desde que, em meados de 2006, fui apresentado à obra do David Bowie.