terça-feira, 30 de junho de 2009

Pedagogia

Estou em dúvidas quanto à capacidade humana de aprender. Certamente, é um problema humano, generalizado. Espero que seja. Não pode ser exclusividade minha. — A acreditar nisso, prefiro o solipsismo!

Estou realmente indignado. — Como pode alguém tão reiteradas vezes bater a cabeça na parede, sem se importar com o que lhe ensina a experiência?! — Como pode alguém ser tão indiferente às lições da vida e insistir, e permanecer, e estagnar!?... — Como posso ser tão cabeça-dura; justo eu, que posso optar por ser só e tão naturalmente só?!

É como andei dizendo por aí: livre-arbítrio é um conto-de-fadas. O universo todo é uma mesa de bilhar — e, perto da tacada, sou pequeno demais. (O pior é que parece que nem isso eu aprendo...)

domingo, 21 de junho de 2009

O Solipsista

Pois, o Solipsismo é a melhor explicação do mundo. De que adianta existir algo além de mim mesmo? E daí que existam outras pessoas no universo? A solidão é inevitável; tão inevitável que deixa de ser um problema. Eu amo o solipsismo, quase tanto quanto ao café; mas o que amo acima de tudo é a mim mesmo.

Nada há no mundo de mais importante que eu — disso também é impossível e inútil fugir. Tudo o mais — se é que há — gira em torno de mim; é fruto de mim; é consequência unicamente de mim. De que importa se ninguém visita este blog, se é que há quem possa visitá-lo? — De vez em quando, uma e outra miragem, pingadas; mas que vêm a comando de sabe lá o quê, pra me fazer sabe lá o quê. — Pois, tratemos um pouco mais sobre isso...

É mais difícil adotar um solipsismo egoteísta, pois torna-se mais difícil conviver com a chateação, o tédio e outras coisas desse nível, indesejadas. Por isso, enquanto não consegui aderir completamente ao solipsismo, convido todos vocês, leitores hipotéticos deste blog, a se juntarem a mim em minha busca por um solipsismo alteregoteísta tendente para egoteísta. Saibam antecipadamente que, à medida em que vocês forem se juntando à minha seita, vocês vão deixando de existir e deixando de ter vontade própria, à medida em que eu me torno o deus do meu próprio mundo. Se servir de consolo, devo dizer que isso não lhes será nenhum problema, pois vocês afinal sequer existirão! — Afinal, quem não existe não se importa...

Enquanto isso, vou tratando de aumentar minhas habilidades — o que, em última análise, é algo que faço para tomar as rédeas do meu mundo, subjugando-o a mim. Assim sendo, devo também dizer que, como tenho adquirido habilidades nos últimos anos, vocês têm se tornado cada vez menos existentes. Se é que vocês ainda dispõem de alguma autonomia e desejam mantê-la, eu recomendo que vocês me matem o quanto antes. Se eu continuar vivo pelos próximos vinte anos, talvez nenhum de vocês exista mais. — Se eu estivesse nessa situação, ia considerar a hipótese de homicídio...

domingo, 7 de junho de 2009

A Praça

Moro numa cidade estranha, cheia de coisas estranhas. Na Metrópole, nas faixas-de-pedestres abarrotadas e disputadas, as pessoas — que se acotovelam quase sem se enxergarem — parecem menos distantes. Aqui, todos se vêem, como se vê a um semáforo fechado, ou a um pedestre que determina a parada obrigatória. Nas ruas todos se concebem quase como a objetos, como se o clima seco fosse capaz de infligir às almas aridez. Nas ruas, no lugar de pessoas, há pedestres; nos shoppings e elevadores, há transeuntes. 


Mas nas salas, há colegas. Lá os candangos retiram suas couraças e se revelam humanos; tão ou mais humanos que na Metrópole ou no Interior. (Talvez seja porque nas salas há umidificadores de ar.) Pois, nas salas, é como se encontrássemos em suas casas velhos parentes, que nos recebem com um café quente e um abraço caloroso. Então se descobre que a Capital não é habitada apenas por bonecos de bronze.

Quem me conhece sabe que aqui não estou feliz; sabe também que eu não estava feliz onde estava. Às vezes me perguntam se eu desejo voltar. Não compreendem quando eu digo que já não é possível. O lugar do qual sinto falta já não está na lá; está onde só posso chegar com a lembrança. Deixei uma parte de mim pra trás; não no espaço, mas no tempo. O que está a apenas 1000km de distância está perto; está comigo. Aqui — ou seja, neste momento — minha sede é maior que minha capacidade de beber. Faço companhia aos bonecos de bronze.

sábado, 6 de junho de 2009

BR-070

Bate em meus pulsos um vento frio de saudade; algo como quando me deparei com a Metrópole; mas a semelhança, se há alguma, está na essência, muito abaixo da superfície. Naquela ocasião, comecei a relembrar de tempos remotos; a sonhar com imagens longínquas; com algo que se tornara passado sem que eu percebesse, como se entre um tempo e outro houvesse um período de escuridão, introduzida por uma sonolência suave e súbita... Teria sido um período misto de sonho-bom e pesadelo, em que eu me encontrava sobre um penhasco à beira-mar, tendo aos pés pedras cristalinas a serem lambidas pelas ondas; em que, nos momentos de maior lucidez, sentia o vento frio e reconfortante de um fim-de-tarde sem sol, que ansiava por me unir as pálpebras, para me trazer à língua o sabor acre das pedras. Era outra, aquela saudade...

Hoje tenho uma saudade sem dor, amadurecida, resignada. Sonho e deliro ainda, mas provavelmente. O tempo passa devagar enquanto por nada espero, num primeiro sinal de velhice. Começo a descobrir certa força; a realizar certos propósitos; mas o faço como a uma obrigação acessória, quase fastidiosa. Muitas pequenas alegrias, quase nenhum desgosto; — o interior vazio. Saudades daquela solidão tão profunda e rica, que só pode assolar a quem tem próximo de si um ser amado.

Poucos metros à frente, naquela mesma estrada, um condutor que procure o retrovisor central encontrará uma motocicleta, guiada pela sombra de um personagem de ficção.