terça-feira, 21 de outubro de 2008

Café com namoro (Republicação)

Belo Horizonte, 6 de maio de 2006.

Recentissimamente, descobri que minha mente é bastante diferente do que costumo — ou costumava, ao menos — adjetivar de "normal". Neste momento, até me surge a oportunidade de aprender a me amar mais, verdadeiramente. E a notícia mais animadora das minhas últimas 24 horas é minha loucura. Alguém, certo dia, me perguntou se eu estava ficando louco — e me senti ofendido. Agora, estou em paz, e minha loucura se torna motivo de grande alegria.

A normalidade nunca me atraiu — ou, pelo menos, não me lembro de nada nesse sentido. Odeio a mediocridade — e a isso se deve a maior parte das vezes em que odeio a mim mesmo. Para mim, mediocridade é íntimo amigo da normalidade; ser normal é ser medíocre. Eu me amo por ser louco. E sou mesmo louco e doente e mau — além de egoísta, o que eu já sabia há séculos. E eu quero ser cada vez mais egoísta, mau e louco. E quero parar de me esforçar para ser aquilo que vocês querem que eu seja. — Mas, por favor, continuem me pressionando, pois isso é um bom tônico para minha companheira mais fiel, a insanidade.

Neste momento, o café é também grande e adorável companheiro. Adoro essas coisas esquisitas, que nos provocam o sentimento de amor e ódio. Gosto da oportunidade de passar por coisas que ofendam minha idiotice, como essas necessidades idiotas de dormir, comer ou "ser feliz". O café me passa a impressão de que não vou conseguir dormir, e me dá o estranho desejo de bebê-lo até eu perder a noção de se estou tonto ou apenas com os olhos molhados. E há a dor-de-cabeça e o enjôo, de que gosto menos. Mas que mal há? É sábado, então até posso sentir enjôo; ao menos, não preciso me importar com o que os infelizes segurados do INPS vão falar quando eu me levantar daquela porcaria de guichê para tomar o meu querido café. E que eles entendam o recado do INSS: morram pobres e cedo! — Ah, mas acabo de me lembrar de que o estoque de café institucional acabou; então, morram alguns dos meus colegas cafezeiros daquela também infeliz agência, para que me sobre mais café!

Estou cansado de lutar contra minha loucura. Estou cansado de tentar não falhar. Estou cansado de tentar ser diferente do que sou. Estou cansado de tentar ser sincero. Estou cansado de tentar convencer vocês de que eu sou alguma coisa que presta. E eu amo o cansaço, assim como o café.

Certo dia, alguma bia me disse que há um belo arco-íris depois do cansaço; e que há lá um belo papagaio a disparar considerações sobre si mesmo; e que há lá também um belo maestro que encanta uma platéia paralizada por sua orquestra desafinada pelo papagaio; e que essa platéia se encanta com o maestro, o papagaio e, sobretudo, consigo mesma; e que, depois desse belo arco-íris, cruzada a imperceptível fronteira de um novo dia, descobrir-se-ia uma intensa e branca e falsa paz doméstica, que anunciaria um tirano e apaixonante horizonte de belezas e horrores. Por causa disso, um dos setores secretos do meu agora ardente coração possui um intenso carinho pela Segunda Divisão do Brasileiro, e amo o cansaço, o café e o traiçoeiro arco-íris. Por causa desse amor, até quero me esquecer de que beatrizes mentem, apesar de elas cometerem o multi-afiançável crime de fazerem-no ainda mais que eu mesmo.

Atualmente, considerando que nos últimos anos tenho desesperadamente procurado algo com que eu sempre possa contar, minha nova namorada é minha loucura. Ela me ama mesmo quando infielmente me esqueço de sua presença. Um dia, até pensei que ela fosse ciumenta, mas aquilo que vi era simplesmente ela mesma, que possui infinitas caras. Namorá-la é como estar rodeado por infinitas mulheres misteriosas e misteriosamente apaixonadas. E tanto sou mesmo ignorante e incompetente que diversas vezes rejeito uma sua bela face por não reconhecer sua beleza misteriosa, sempre muito maior que minha atenção. Se ela continuar assim, compreensiva, talvez nos casemos futuramente. — Ela até fez um aborto na semana passada, de um filho que eu não saberia amar, mas parece que já está grávida novamente. Uma atraentíssima característica da minha loucura é que ela não se importa com o aborto, nem com o infanticídio; continua sempre presente, com suas infinitas caras.

Resumidamente: estou muito bem, mas com muitas saudades.

Carinhosamente,


Lekso

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